segunda-feira, 21 de junho de 2010

Também gostava de me ser assim...no ir

(imagem - google)
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Diz-se por aí que as gaivotas voam sem destino.Eu penso que não. Já as vi em voos rectos, ou traçando semi-círculos sobre as águas, nada fazendo prever que se juntassem para que as víssemos de longe, tal é o seu trajecto nos céus, que se apresentam sempre nublados, quando elas choram e tudo lhes é negado.

Afundaram-se os barcos todos na última noite de temporal e sobre as águas boiavam corpos inchados, presos na forte ondulação. Foram estes os mais afoitos quando se atiraram ao mar, só porque ouviram um grito pensando ser tudo, menos o final dos tempos. As embarcações sofrem da miséria que as águas carregam sempre que por detrás dos detritos se encontra um corpo arrastado num qualquer convés de um barco que se perdeu. Sem bússola, deverá seguir por águas pertencentes a outros reinos, onde o inimigo espreita submergindo no meio do oceano. Os gigantes dos mares trouxeram, um pequeno astrolábio, para que dos céus, chegassem novos sinais, prontos a cair no centro da terra, mas nada viram enquanto esperavam a morte a surgir por entre as marés.

(As gaivotas traçaram novos círculos de fogo. Aguardam sempre pela volta dos ventos, pela mudança dos tempos)

Às vistas de um mundo que se prende na longevidade de um tempo morto,eu também gostava de me ser assim....no ir, mas temo que ainda falte muito tempo..Por isso, fico-me por aqui neste olhar novo, onde a memória me prende aos costumes diários, ouvindo os sons de vozes que me levam de vez em quando. São estas que me são afeiçoadas, quando se mostram únicas verdades pelo tempo, que por ser indefinido, me prende na lonjura já gasta de vários caminhos. Se me consentisse ver o que os meus olhos sempre querem, já não estaria neste desejo do querer o que não me quer, ou de ser o que não se pode. Dei sempre um sentido uniforme às linhas perpendiculares do meu corpo, mas ele, tosco por dentro e desafinado por fora, consentiu que me aplicasse também, um rosto deformado e vazio. Caminhou sempre em frente. Nunca olhou para trás, porque se o fizesse, assumia-se perdido para sempre.

sábado, 19 de junho de 2010

Supernova



Seriamos vento estelar
Nus pela lua nova
Processando a luz do génesis
Nos corpos em recife de coral

Sedentos de oxigénio
Entregues ao frenesim dos pássaros
Em beijos de praia mar
Para a sagração dos amantes
A nós regressaríamos humildes cristais

Vertendo em pêlo as gotas do amor
Imortalizando a praia que te baptizou…
…Mar
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Poesia de Albertos

sábado, 5 de junho de 2010

Além de nós e em nós

Num mundo de luz e sombras, há a focagem natural de um olhar. Movimenta-se nesse enquadramento, fechando-se umas vezes, abrindo-se outras tantas, numa ondulação vigilante, incorporando as leis da cosmologia simbólica. Resta saber o que escolhemos; se a noite, se o dia. Mas isso também nada nos diz, se não soubermos distinguir de olhos fechados, onde reside o ser que nos vai aliviando da cegueira em que vivemos, emparedados nestes movimentos fechados. Aguardar pela sintonia de um corpo, é estabelecer a ligação e aceder aos mais altos níveis sensoriais, transcendendo os lugares físicos, através de um processo natural, onde ele se encontre, sabendo que na terra, há um local onde ele está na sua plenitude. Um só!

Desajustamos os meios que medeiam as palavras, transportando-as para um mundo que nos fará ver tudo através de vitrais acostumados a certos parâmetros na visibilidade da luz, contudo, há um prolongamento perfilado nos papéis resguardados da memória, que nos dirá de um mundo e da sua forma, sem sairmos do nosso circulo geométrico. É esta visão, respeitada por todos os membros que saibam desempenhar, cada um o seu papel, sempre que os olhares se fechem e tracem a tangente que divide o absorto mundo, num todo absoluto. Aí, reside a força maior que somos nós, num conjunto formado por diferentes máscaras a corroer-nos a face e a denegrir-nos o olhar que nos traz e nos leva.

Sairmos deste quadro analítico e saltarmos para uma verdade estável e duradoura, é sentir que nas profundezas de um corpo, está um dispositivo que se enquadra nas mediações da mente, acordando o espírito para a necessidade mais básica do ser humano: ser em todas dimensões que existem, além de nós e em nós.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Momentos especiais saídos do fundo das memórias

(foto, Dolores Marques)
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Se os mitos que nos identificam nesta pequena parte do mundo e que nos têm guardados até ao começo de um novo mundo, forem mitos de gerações vindouras, a minha boca será ruidosa e frutuosa num corpo vivo. Honrarei as figuras desenhadas por um beijo e matarei esse desejo louco de me teres nesta solidão nocturna. Lamento não poder chegar de madrugada nesse momento inquieto e amadurecido pela noite, mas não posso. Seria continuar num caminho que me quer quando já nada acontece e não me diz que sou maior que o vento que bate nas vidraças da tua janela. Há um mar inquieto nos teus olhos, há uma soma de gestos, vestidos para viver em plena luz, num dia que se abre e fecha, sempre que chega a hora da despedida desta furna que me afoga em mar ardente de desejo. Saio para a rua e deito-me nas horas enquanto espero por boas novas através de sons de palavras outras, que chegam devagar.

Muito lento é agora desejar o que não tenho e absorver aromas doces que se espalham pela atmosfera. Um misto de outroras vindas do céu, que se esbatem no nevoeiro, formado à roda dos meus olhos e que se acomodam num pensar distinto e sobranceiro. Morro sempre que meus olhos te vêm nesse labirinto fechado, de ideias tresmalhadas e continuadas num reescrever que faz doer a pena de quem se reescreve por todos os caminhos já fechados. Fico assim, aguardando pelo teu regresso, ou pelo que resta de ti, após teres esgotado todos os amores que te assentam como luvas de algodão, tal qual o manto dourado que te cobre o rosto. Saíram de um cofre forte, que só o tempo abriu e amainou quando sobrevoaram um mar que se quis forte no meu peito. Gastei-os num dia de felicidade, daqueles que só se conhecem em momentos especiais, saídos do fundo da memória. Estarão prestes a abandonar o cais e a debandar pelas marés altas, indo sem destino à procura de outros céus maiores, de onde se poderão ver outros sons, outras bocas, outros rostos que se queiram peregrinos num novo mundo.

- Se porventura me encontrarem morta, deixem-me ficar a gastar-me no chão que me há-de cobrir por inteiro, porque para me terem na vossa verdade, eu terei que morrer primeiro.

Terão que me enxergar, fechando os olhos aos meus olhos, a boca à minha boca, o corpo ao meu corpo. Só há um modo de me encontrarem…. Estarei para todo o sempre enraizado na vossa memória e lembrando de mim, serão eu - ser vivente em ondas vibratórias, nas mediações de um corpo aberto a novas conciliações.