sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

As Minhas Palavras


Serena, imóvel mas inquieta
Por verdades que esqueço
Por vaidades que abraço
Por inconsequentes
Marés de cansaço

Sou tudo o que quiseres
Neste mundo que chora
Por um único abraço
Sou remoinho de vento
Sou fatia de pranto
Enquanto me não refaço

Invisível é o meu traço
Há um esboço do que sou
Nas escadarias de onde venho
Que se quebrou em pedaços
Quando voltei a minha face nua
Para as ruas onde me enlaço

Acasos de uma morte anunciada
Prestes a cair no nada
E insinuada pelas máquinas do tempo
Que me arrastam do sítio onde nasci
E me contam de um mundo
Gasto em palavras

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Ultimatum

Debrucei-me sobre as aspas de uma frase oblíqua
Saliente, tosca, disforme mas de cintura fina com um brilho mate
Distante, tão distante estava eu antes dela me reescrever
Fui caminhando sem ver
Fui cessando sem saber

Havia um só tempo para seguir aquela linha inteira
Que me traçava um caminho aposto no meu imaginário

Já não sou eu que quero ser uma frase inteira de um céu sem cor
São elas, as aspas que me fazem ser alguém
Ou nas horas mortas ninguém

Já não sou eu que quero ser uma palavra vã,
Achada por morte sã
Catalogada e alegórica(mente) certa , mas indiscriminada
E sujeita ás mais diversas alterações morfológicas
Resíduos que se despejam nas marés vivas de um desejo traído, cuspido, sujo

Caiu agora desse mastro antigo
Desdita esta sorte mal(dita) em pedaços
Que se entrega à dor das palavras sobrepostas
Viajaram caladas nas costas arqueadas de um marinheiro já morto
Deram um saldo no mar alto e afogaram-se inteiras na linha disposta sobre a mudança das marés
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(Eu na foto, da autoria de José António Antunes)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Sigo-te


Um ritual que apetece seguir
este teu caminhar sobre as águas
sempre incentivador
à volta das marés claras.

Há na força dos ventos
uma brisa que te acalma
nas manhãs submersas
e sou tudo o que disseres
quando já nada quiseres ser em mim

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Um só verso no teu caminho e o meu corpo caravela


Se me propuser a ser um só verso no teu caminho
Tu verás que há noites, menos noites, e dias menos dias
Caminharás por sobre a crosta terrestre
E eliminarás um espaço que te sente numa vida quebrada em pedaços
(Se tu te dispuseres, a ser mais que um poema, na varanda dos teus sonhos
Eu farei das tardes, outros mundos e do meu corpo caravela)
Mas se por acaso na tua memória
Eu anoitecer num espaço fechado
As noites farão tudo por mim
Quando te anunciarem
O que há muito te contaram
Mas que esqueceste

(Restamos assim tu e eu, pelos tempos que ficarem)


segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Em segredo (XIV)

(Foto, Dolores Marques)
*
Sofro da dor que se enquadra
Nesta tela ainda fresca
Da minha memória:

Um caminho cruzado
Os Deuses sempre em festa
E nós largados ao abandono

Se quiseres
Dar-te-ei os meus lábios
Em troca de um último segredo teu
E que os corpos se aquietem
Num leito feito de aromas
Unção predestinada a ser
Um desejo só nosso
*
(Segredos Meus/09)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Personificação de Um Alter-Ego, Essa Entidade Viva



O início de mais um ano nas nossas vidas, será antes de mais um inicio de mais um caminho que se abre às mais variadas mudanças que se têm como certas. Será só uma dose individual de vivências, que transformaremos em sonantes e diversificadas notas soltas que se espalham pela nossa mente, se virmos a mente como um refúgio para os tons mesclados de alter-egos. Mas se nos focarmos no centro, aquele mesmo ponto de onde saímos e para onde vamos sempre que o nosso ego se ramifica espalhando vários tipos de personas qualificadas pelo nosso interno e consciente saber, veremos as mais variadas formas de conseguir transportar todas as maleitas de que somos vítimas, e consertar ou quiçá, remendar a nossa mente adjudicando propostas de um alter-ego menos egocêntrico num sentido mais lato.
Este é um ano que me proponho ser mais que um simples papel escrito nas memórias de uma vida. Serei antes de mais uma pessoa que se encontra sempre que ama, mesmo que esse amor vá de encontro a retalhos à vista, feitos de consumismo barato. O que se consome, nem sempre é de melhor qualidade, mas o gosto com que se pratica o consumismo, é um gosto que fica para quem sabe que o consumo é ou deve ser tido, como uma satisfação das nossas necessidades e não um granjear do supérfluo, que nos faz engordar e também inchar à custa do ar saturado de atmosferas densas e poluídas. É um gosto saber-te aí e imaginar que me estás a ler agora, e que sorris porque entras em mim e eu em ti, sem o toque da pele esquentada e sem o olhar flamejante. Daí não saber muito bem se concordo com esta tua frase: “torna-se viciante para o nosso ego essas manifestações de carinho constante”. Vou-te saboreando na medida certa, sempre que te sinto através das palavras que escreves e isso para mim basta por agora, porque sei que este “agora”, é o que de ti recebo. Acolho-o com o carinho de sempre, assimilando só o essencial. O teu EU mais profundo.
Existe na força viva que carrego um movimento que desconheço, mas através dele, farei uma movimentação diferente aos olhos e dar-me-ei a conhecer a mim própria através da forma como me sinto quando partilho algo. Nunca, qualquer manifestação de carinho, se interpôs entre um ego mais necessitado e um alter-ego mais realizado, e talvez por isso eu goste tanto destas manifestações que prefiro dizer que Amo, para que não haja atritos entre eles.
Mas isto tudo só porque te queria desejar um ano fantástico e vê no que deu, logo eu deixei e ser eu, para ser um alter-ego qualquer em busca daquilo que o ego tem – Suposições e frustrações de quem não sabe, que o AMOR só é importante na medida em que o sentimos dentro de nós. Falo-te de um sentimento que enaltece qualquer ser humano que se preste a Ser antes de mais e que sinta que o Amor é para ser “consumido”, nas doses certas, sempre que a pele respirar o tal aroma quente e aconchegante. Nunca o AMOR será palpável nem materializado em casos de última hora ou até uniões vs concentrações para um futuro imediato, será sim uma entidade viva e vigilante em cada Pessoa. Mas, para que isso seja possível sem nos despojarmos de nós, teremos que nos separar de egos indesejáveis, ou então não haverá solução e teremos que esperar pela verdadeira mudança, que estou certa irá deitar por terra, todo um conjunto de vivências de uma vida. Penso que ela já faz parte de um processo onde estamos todos inseridos, e acredito que essa mudança está a acontecer neste momento em todos nós sem nos darmos conta disso, pois manifesta-se através das mais variadas posições na vida. Podem até ser as mais inconscientes, e até as mais revolucionárias dando forma aos pensamentos, mas será muito também na postura e no confronto com o outro. Esta nova era, será o volt-face, o início da verdadeira mudança que começa em nós, no nosso interior e vai fazer com que nos transformemos internamente ao ponto de nem sabermos quem somos, quer pelas manifestações de carinho e amor, quer pelas manifestações de ódio que nos consumirá até à mais ínfima partícula do nosso ser.

(In A voz do Silêncio – Carta a uma amiga)
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Vem Sentar-te Comigo Lídia à Beira do Rio
..."Desenlacemos as maos,
porque nao vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixoes que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar...."

Ricardo Reis (F.P.)

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Movimentos(P/Rosafogo)

(Foto, Dolores Marques - Vistas para a segunda Circular)
*
precisei destas palavras tuas
nestes dias
em que a chuva me entrou de rompante
pela fronte ressequida
e eu, alheia ao movimento das águas
*
(segui-te os passos
e encontrei-me e em todos os recantos que conheço)
*
Mulher que me falas assim
que te deitas nas noites
e adormeces o fado quente
a luzir nas paredes frias
de uma vida que grita
por ti
e por mim
num vazio encontro nas ruas
*
Estou por aqui, sempre que te esqueças de ti

*
Agradeço a Rosafogo, a inspiração para este poema, aqui:
http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=107915