segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Palavras ao vento (Para ti Onix) de Guel.Vaques

(foto D.M.)



Passou
Uma asa
Solta no vento

Trago um jardim no bolso
E a vontade de sonhar o mundo
Espelhada nos olhos
Que elevo às estrelas, todas as noites.

Ao alcance de um braço.
Trago preso no dedo, com um fio de lágrimas
Um balão cheio de vozes
A roçar o céu, de nuvem em nuvem.

Cansa-me o silêncio.
(Não sei quando voltarei a mim, de novo
Não sei onde me leva este caminho).

Invade-me por dentro
A dúvida, sobre a direcção do vento.
Resgato todas as caravelas naufragadas.
Iço velas nos mastros quebrados
À intensidade do som
E parto, a navegar
Pela latitude da alma
Onde o mar distante, se torna mais distante.

Ficou
A sensação
Que tudo é tão pouco
Nas asas do tempo

São cinzentos invernos
De noites e de lágrimas
A engrossar o rio, a desaguar no oceano.
Ao sabor da corrente
Que se estende
Em volta dos homens sós.

É nessas mãos, vazias
Onde se afundam os sonhos.
É quando o tempo pára suspenso
E entristece, por não saber dos teus passos
Dos teus dias, dos teus lugares…

É quando o rio acorda, nas pedras de um farol
Que não te sabe da janela fechada à noite…
E mesmo que as estrelas não te sigam
O seu brilho está dentro de ti.
Seja por um segundo de noite
Seja em todas as noites
Elas continuam a cair, do céu.
Há um plano superior
Onde confluem todos os ventos horizontais
Que sopram nas tuas palavras.

Agradeço ao Nuno Marques por esta dedicatória

sábado, 13 de novembro de 2010

Qual é o meu rumo (de José Fernando Lobo Duarte)

(aguarela de Fosé fernando Lobo)

Qual é o meu rumo
qualquer lugar onde durmo
é um bom costume
pra sonhar com você.
Acordo e aponto no firmamento
...as coisas felizes
que vejo no teu olhar
e mesmo que o meu pensamento pareça distante
agradeço á vida ser o teu amante.

E até parece que esta minha esperança
não vai acabar
eu serei criança
parada no teu olhar.
Qual é o meu rumo
qualquer lugar onde durmo...
Ver mais


(José Fernando Lobo Duarte, Poeta, Pintor, amigo, obrigada pela partilha)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Esperar


esperar para conseguir entender as várias orientações que me querem levar onde não quero ir:


será que consigo atingir o cabo do mundo e voltar a tempo de encontrar as mesmas ordens, orientando as massas e desconfigurando os novos sistemas impostos pela única ordem vigente num mundo a cair aos bocados?

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Doidices

(Imagem google)


Palavras estão a milhas de serem verdades inteiras na arena, onde sempre as encontro envolvidas em chacinas de um milhão de letras que fogem sempre que a mão lhes pega de frente.
Há pegas que até se podem ver, outras nem por isso me dou ao trabalho, mesmo que entendesse como pegar o touro pelos cornos. Há touros que se defendem e bem desse tipo de pegas, que ultrajam tudo e todos, sempre que fazem uma boa pega. Rodopiam, rodopiam e somem-se na poeira ensanguentada. São como certas palavras que até se encolhem, sempre que lhes cheira a sangue de uma mão esfolada de tantas pegas fazer. Ela cai no pó, na merda, na chafurdice, mas ainda assim, se ressalva o brilho do anel em coroa, onde tem gravadas as palavras: "Amem-me, odeiem-me, ou então, esqueçam-me na arena. Lá, há merdas que ainda me aturam as doidices de querer escrever poemas".

sábado, 18 de setembro de 2010

Rabiscos da Alma - de Mefistus


Nascido em Lourenço Marques a 17 de Janeiro de 1973, filho de pais Portugueses, Rogério Paulo Peixoto vem para Portugal com três anos de idade, ficando a residir na periferia do Porto. Segue a área de Humanísticas, no Externato D. Duarte, ingressando em 1991 na Universidade Lusíada, no Curso de Direito. Actualmente a residir em Penafiel, estreou-se no Mundo Literário em 2007, com a obra “A Luz das Estrelas – Mefistus”.
(foto, Dolores Marques in Grafitis - uma arte no escuro)


O inicio de tudo
O principio de mim
Em rabiscos de alma
Em letras de cetim.

O inicio...
O começo
O recomeço
O desespero
Inquieto.

Rabiscos de Alma
O meu devaneio
O mundo de permeio
Tudo é verdadeiro

Sou este que vos escreve
Sou eu quem vos descreve
A ilusão de vos escrever
Um dia...até morrer!

Mefistus


Mefistus se algum dia eu me dispuser a ler-te o inverso, terei a maior surpresa que um olhar poder ter, e a alma será uma fonte de inspiração para ti e para mim, quando nos juntarmos e nos dissermos, sem qualquer tipo de vaidade, ou descuido pela escolha das palavras.

Gosto do que escreves e muito. Obrigada

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Enigma (para Alcantra)





Como decifrar um enigma que está presente até no seu respirar, na movimentação dos seus olhos sobre uma folha em branco, sobre um telhado sobreposto, onde os pássaros fazem o ninho e simplesmente se amam se respeitam e partem rumo à liberdade dos seus sonhos?





Gostei do que li de Alcantra, aqui:



segunda-feira, 30 de agosto de 2010

ônix


Forma de quartzo
Uma pedra polida pela mãe montanha
A luz flúi e espalha-se
Dizem que protege
Disseram os romanos, os gregos, os indianos
A luz protege
Do negrume dos interiores maciços
A luz
O milagre libertador das trevas
A luz não a pedra
Ónix
Uma forma de quartzo
Um poema em rocha
Um brilho em céu
Uma esponja de vida borbulhante
Nascente de vivências
A terra que se pisa
E uma forma de quartzo polida
E tão cheia quanto os teus dias
*

Poema que me foi dedicado por Carlos Teixeira Luís


Labirintos


Se ao virar da esquina
Encontrares
Uma alma moribunda
Esquece-a
Como esqueceste
O sítio onde moras

Há moradas
Que servem de aposentos
A frios desertores
Que por se saberem ordeiros
No mundo dos vivos
Deixam a nu
Os mirantes dos seus olhos
*
Sei-os por me saber
Em plena mesura
E formatura
Resgatando em absoluto
Os labirintos
Onde nascem os seus credos

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Amor meu


(Tela de Paula Rego)

Ajuda-me
Ouve-me no silêncio
Que é a tua voz
Amor meu

A encontrar um amor
Do tamanho do céu
Um amor
Que me vire ao contrário
Que me diga de mim
Que me veja sorrir
Amor meu

Ajuda-me
A saber-me
Em ti
Amor meu
Aclara-me os olhos
E encontra-me
Sempre
E para sempre
Em Amor
No teu

Amor meu

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Também gostava de me ser assim...no ir

(imagem - google)
*
Diz-se por aí que as gaivotas voam sem destino.Eu penso que não. Já as vi em voos rectos, ou traçando semi-círculos sobre as águas, nada fazendo prever que se juntassem para que as víssemos de longe, tal é o seu trajecto nos céus, que se apresentam sempre nublados, quando elas choram e tudo lhes é negado.

Afundaram-se os barcos todos na última noite de temporal e sobre as águas boiavam corpos inchados, presos na forte ondulação. Foram estes os mais afoitos quando se atiraram ao mar, só porque ouviram um grito pensando ser tudo, menos o final dos tempos. As embarcações sofrem da miséria que as águas carregam sempre que por detrás dos detritos se encontra um corpo arrastado num qualquer convés de um barco que se perdeu. Sem bússola, deverá seguir por águas pertencentes a outros reinos, onde o inimigo espreita submergindo no meio do oceano. Os gigantes dos mares trouxeram, um pequeno astrolábio, para que dos céus, chegassem novos sinais, prontos a cair no centro da terra, mas nada viram enquanto esperavam a morte a surgir por entre as marés.

(As gaivotas traçaram novos círculos de fogo. Aguardam sempre pela volta dos ventos, pela mudança dos tempos)

Às vistas de um mundo que se prende na longevidade de um tempo morto,eu também gostava de me ser assim....no ir, mas temo que ainda falte muito tempo..Por isso, fico-me por aqui neste olhar novo, onde a memória me prende aos costumes diários, ouvindo os sons de vozes que me levam de vez em quando. São estas que me são afeiçoadas, quando se mostram únicas verdades pelo tempo, que por ser indefinido, me prende na lonjura já gasta de vários caminhos. Se me consentisse ver o que os meus olhos sempre querem, já não estaria neste desejo do querer o que não me quer, ou de ser o que não se pode. Dei sempre um sentido uniforme às linhas perpendiculares do meu corpo, mas ele, tosco por dentro e desafinado por fora, consentiu que me aplicasse também, um rosto deformado e vazio. Caminhou sempre em frente. Nunca olhou para trás, porque se o fizesse, assumia-se perdido para sempre.

sábado, 19 de junho de 2010

Supernova



Seriamos vento estelar
Nus pela lua nova
Processando a luz do génesis
Nos corpos em recife de coral

Sedentos de oxigénio
Entregues ao frenesim dos pássaros
Em beijos de praia mar
Para a sagração dos amantes
A nós regressaríamos humildes cristais

Vertendo em pêlo as gotas do amor
Imortalizando a praia que te baptizou…
…Mar
*
Poesia de Albertos

sábado, 5 de junho de 2010

Além de nós e em nós

Num mundo de luz e sombras, há a focagem natural de um olhar. Movimenta-se nesse enquadramento, fechando-se umas vezes, abrindo-se outras tantas, numa ondulação vigilante, incorporando as leis da cosmologia simbólica. Resta saber o que escolhemos; se a noite, se o dia. Mas isso também nada nos diz, se não soubermos distinguir de olhos fechados, onde reside o ser que nos vai aliviando da cegueira em que vivemos, emparedados nestes movimentos fechados. Aguardar pela sintonia de um corpo, é estabelecer a ligação e aceder aos mais altos níveis sensoriais, transcendendo os lugares físicos, através de um processo natural, onde ele se encontre, sabendo que na terra, há um local onde ele está na sua plenitude. Um só!

Desajustamos os meios que medeiam as palavras, transportando-as para um mundo que nos fará ver tudo através de vitrais acostumados a certos parâmetros na visibilidade da luz, contudo, há um prolongamento perfilado nos papéis resguardados da memória, que nos dirá de um mundo e da sua forma, sem sairmos do nosso circulo geométrico. É esta visão, respeitada por todos os membros que saibam desempenhar, cada um o seu papel, sempre que os olhares se fechem e tracem a tangente que divide o absorto mundo, num todo absoluto. Aí, reside a força maior que somos nós, num conjunto formado por diferentes máscaras a corroer-nos a face e a denegrir-nos o olhar que nos traz e nos leva.

Sairmos deste quadro analítico e saltarmos para uma verdade estável e duradoura, é sentir que nas profundezas de um corpo, está um dispositivo que se enquadra nas mediações da mente, acordando o espírito para a necessidade mais básica do ser humano: ser em todas dimensões que existem, além de nós e em nós.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Momentos especiais saídos do fundo das memórias

(foto, Dolores Marques)
*
Se os mitos que nos identificam nesta pequena parte do mundo e que nos têm guardados até ao começo de um novo mundo, forem mitos de gerações vindouras, a minha boca será ruidosa e frutuosa num corpo vivo. Honrarei as figuras desenhadas por um beijo e matarei esse desejo louco de me teres nesta solidão nocturna. Lamento não poder chegar de madrugada nesse momento inquieto e amadurecido pela noite, mas não posso. Seria continuar num caminho que me quer quando já nada acontece e não me diz que sou maior que o vento que bate nas vidraças da tua janela. Há um mar inquieto nos teus olhos, há uma soma de gestos, vestidos para viver em plena luz, num dia que se abre e fecha, sempre que chega a hora da despedida desta furna que me afoga em mar ardente de desejo. Saio para a rua e deito-me nas horas enquanto espero por boas novas através de sons de palavras outras, que chegam devagar.

Muito lento é agora desejar o que não tenho e absorver aromas doces que se espalham pela atmosfera. Um misto de outroras vindas do céu, que se esbatem no nevoeiro, formado à roda dos meus olhos e que se acomodam num pensar distinto e sobranceiro. Morro sempre que meus olhos te vêm nesse labirinto fechado, de ideias tresmalhadas e continuadas num reescrever que faz doer a pena de quem se reescreve por todos os caminhos já fechados. Fico assim, aguardando pelo teu regresso, ou pelo que resta de ti, após teres esgotado todos os amores que te assentam como luvas de algodão, tal qual o manto dourado que te cobre o rosto. Saíram de um cofre forte, que só o tempo abriu e amainou quando sobrevoaram um mar que se quis forte no meu peito. Gastei-os num dia de felicidade, daqueles que só se conhecem em momentos especiais, saídos do fundo da memória. Estarão prestes a abandonar o cais e a debandar pelas marés altas, indo sem destino à procura de outros céus maiores, de onde se poderão ver outros sons, outras bocas, outros rostos que se queiram peregrinos num novo mundo.

- Se porventura me encontrarem morta, deixem-me ficar a gastar-me no chão que me há-de cobrir por inteiro, porque para me terem na vossa verdade, eu terei que morrer primeiro.

Terão que me enxergar, fechando os olhos aos meus olhos, a boca à minha boca, o corpo ao meu corpo. Só há um modo de me encontrarem…. Estarei para todo o sempre enraizado na vossa memória e lembrando de mim, serão eu - ser vivente em ondas vibratórias, nas mediações de um corpo aberto a novas conciliações.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Enquanto Nos Vamos


(Esculturas de Ricardo Kersting)



Seremos almas revigoradas
Nas areias do deserto
Histórias vivas
A voltar atras no tempo
Queda abrupta em terrenos áridos
Novos vultos a preencher
Os espaços anémicos
Que se medem nas distâncias
Entre o ser e o não ser

Há um novo mundo
E uma vida a desfalecer
Enquanto mirram as flores
E deixam um momento em branco
Alimentado por um fio de luz
Enquanto nos vamos

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Becos Sem Saída


Estou num tempo, que nem sei se será o meu, por saber que irei estar num tempo só nosso, nalgum sítio paralelo Mundi-Universo. Sei que as lágrimas que em muitos dias e muitas noites se acumulam, farão deste meu sentido que dou à vida, um rio que corre, e não parará de encher até se completar este novo ciclo. Estou num tempo vivo de forças mortas, mas sei que nos trarão a iluminação “divina” e nele estarás comigo, porque eu sou a metade que se juntará à outra metade, e juntas farão das duas uma só, em função da vida que já vivemos e das que iremos ainda viver.

Mereço a terra, mereço o chão onde me devasso, mereço o céu onde me desfaço em partículas miudinhas, mereço um castigo ainda maior, se me deitar nos TEUS braços e ficar adormecida até ao próximo Inverno. Invariavelmente serei a dor que me arruína a solução aquosa da vida já gasta no meu corpo. Emagrecemos os gestos, mas faremos da vida um tempo inerte de amontoados seres em comunicação com a magnitude de um mesmo centro convexo por natureza morta, mas estático e estilizado por outras viventes nas luxúrias de um tempo castrado e ensandecido nas montanhas de um pensamento. Escalaremos o mundo para trazer à vida um sonho novo, e renovaremos as letras e as palavras que se quiserem entabular nas frases expostas, sendo um só movimento circunscrito pelo tempo que as quisermos.

Haveremos de falar! Haveremos de nos mostrar, quando nos olharmos de frente e nas diferenças, procurarmos a solução para que alguns organizadores de rastilho na mão, incendeiem a dor dos que se fragmentam sempre com uma mão no centro do seu corpo, e a outra nos centros estáticos de um poder imensurável mas castrador de mentes ensandecidas nos submundos. É aí que impera o silêncio que se acumula aos molhos e se purifica, por não saber como falar do mundo que nos acolheu desde que se prontificou para morrer num beco sem saída.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Saber-e o que se procura

Saber-se o que se procura
num mundo vasto em tantas gentes
em gentios gestos de mero in-conformismo
é olharmos outras sementes
que lançadas no sítio certo
darão na medida certa (talvez um alqueire, raso a rasar, por certo)
uma nova semeadura
casta, madura


terça-feira, 13 de abril de 2010

Verdes São As Folhas

(Foto Dolores Marques)
*
Ainda há uma semana estavam nuas, as árvores, esqueléticas na sua forma em ramos esguios, mas abandonados pela cor que a Primavera sempre lhes empresta. Olho-as de baixo para que vejam através da sua altivez, a minha pequenez. O chão, esse está sempre de colo aberto à mínima escoriação do tempo que ali é ponto de paragem entre as pedras e os canteiros dos jardins.

Sofre de tantas penas esta sôfrega manhã de Primavera, e eu caminho assim, meio desatinada pela beira da estrada. O céu indica-me as horas, mas de nada vale saber se há horas certas nesta cálida manhã. Assim, encontro-me também entre a nudez da alma, e coloração de um verde-esmeralda, que em determinada parte do meu corpo, se prepara para esculpir sonhos, e enaltecer os olhares que acalmam as correntes do rio. Este, enquanto espera traz sempre novos ventos e novas investidas no cais, aparentando nobreza e fortalecendo as tábuas do passadiço. Eu, abandono-me ao tempo em que não me cansava de contar as estrelas na minha aldeia:


- Há o “nascer do sete-estrelo”, que corresponde à Úrsula Menor e/ou Maior, que quando se avista por detrás do monte será a hora de encaminhar as águas;
- Há o “por da Estrela” que é a hora exacta na madrugada em que ela se vai, orientando o seguimento de outras águas que descem da serra;
- Há a contagem das horas, através dos raios solares, que ao embater no morro escarpado pelo tempo é também hora de acrescentar mais umas horas às águas que passam;
- Há o "meio-dia do sol", que é quando o sol atinge um ponto no firmamento, que ali é à uma e meia da tarde - formas de contagem do tempo, pelos antigos, para se calcular os movimentos que aquele pedaço de terra dava à volta do sol.

Continuar a viver por entre quatro paredes, será o mesmo que viver enclausurada numa cidade que me entorna sobre os pés, um pouco da calidez do mundo acompanhado das chuvas ácidas. O horizonte é vasto e eu por aqui, de solstício em solstício, sem saber para onde encaminhar os meus passos. Dava-lhes tudo de mim se mo pedissem, se não me rejeitassem, se não me encandeassem com esse brilho meio atordoado de uma vida gasta por sujeições do destino. De que adianta esmiuçarem a minha dor, a minha permanência, se só serão eu, quando souberem também ser? Podem até me virar do avesso, mas só encontrarão o refugo daquilo que fui, porque a cada momento me renovo com o nascimento de novas flores, para vestir as palavras que escrevo, as quais serão alimento do meu corpo e vestimenta que me tape a alma. Há trapos, que como indumentária gasta, se apresentam à limpidez das águas do rio, e  prestes a vestirem os mendigos que ocupam as ruas da cidade. Observando-as de longe nada mais são do que um carreiro estreito por entre vielas de escárnio.
Continuo à espera de os encontrar nestes caminhos, mas nunca os avisto, a não ser quando já nada tenho para lhes oferecer. E eu queria tanto encontra-los para depois voltar a ser poeira das estrelas em direcção ao sol.

Sobrevivo sempre a novos temas, mas o corpo avesso a tudo o que o tempo traz, deu um volte-face, despojado das noites e purificado pelos dias, do mais puro néctar que a vida tem para lhe dar.
E, assim por vezes errantes, somos contrariamente a emancipação da única verdade que nos faz ser, seres invulgares e diferenciados na terra que nos revolverá às cinzas e de lá nos fará renascer únicos na forma. Só assim poderemos encetar novos voos por entre os dedos das nossas mãos, porque são eles, um reflexo laminar do tempo que nos resta.
Verdes são as folhas e nelas me deito até à próxima investida do Outono.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Lavo as Mãos Como Pilatos

Se por todas as razões que desconheço, me encontrar paralisada quando chegar o momento de me dividir em duas, nada me espanta, pois já nada me resta, a não ser algumas gotas de suor morno, que me escorrem pela face rugosa e negra de um cansaço que me segue, desde que o mundo é mundo. Na terra, jaz morto um pedaço da minha fome, e já nada me pertence, sempre que olho o céu e o encontro acoplado a uma abóbada colorida pronta para me dar as boas vindas, e a quem se quiser encontrar comigo, para se inteirar de um mundo que só espera morrer para remissão dos seus pecados. Se por algum motivo, chegar até mim a abundância, tomarei nas minhas mãos as rédeas de um sonho acostumado a viajar no espaço, ocupando-me das coisas mais singelas que a vida tem.

Deus, foi raras vezes um companheiro fiel, pois depositou em mim toda a esperança de me poder sentir eu própria, o resgate de todas as manhãs e me redimir de todos os cansaços impostos por outra face de um mundo que espera e desespera por encontros finais. Mas em verdade me foi dito, que estes encontros nem sempre se assemelham a causas determinantes esventradas da terra e apadroadas por rostos cansados pelo movimento que a circunda. O efeito esvoaçante que vestiu o Homem e o depositou em terra firme, trouxe novas formas de pensar, construídas e edificadas a partir da Fonte, mas a terra não se conseguiu manter no seu movimento de rotação e desfez-se em pedaços, para que cada um deles, representasse a verdade, que tomada ou recebida, seria uma parte do nosso corpo aberto ao tratado do Universo

As águas das nascentes já irrigam os campos, e nas searas, o trigo desponta dourado como o sol do verão. Há um renascer das madrugadas, sempre que me fixar nesta era que me pertence, tanto quanto me pertenceu, aquele que se fez Homem-Deus no meio dos homens e das mulheres que o seguiram, e após, o vestiram de luto. As suas vestes eram de puro linho e a sua casa era de pura argamassa, e o meu corpo sofria por todas as noites que passavam, sem lhe poder dizer, que também aqui, morava alguém, e que apesar das vestes bordadas a ouro, havia um inflexão dos movimentos de um corpo, quase a morrer de sede. Na verdade, serão precisos registos próprios de ADN, capazes de humedecer os sentidos, e os adubar para a longa viagem que finalizará o todo universal do meu corpo, mas continuo lavando as minhas mãos, tal como Pilatos, naquele tempo em que os rios irrigavam as oliveiras, e as preparavam para os novos frutos que dariam luz ao novo mundo

(Foto Dolores Marques)

O painel de azulejos da foto é um revestimento de uma das paredes da Padaria Velha na Manutenção Militar em Lisboa)

sábado, 20 de março de 2010

Rituais Esquizofrénicos


“Sou crente e sonho com um mundo redondo, geometricamente perfeito" (José Luis Lopes)

Na forma como vemos o mundo, já existem novas formas pensadas e ajustadas ao novo mundo. Contudo, não temos ainda olhares prontos para o fixarmos num ponto e o elegermos, através da forma que podemos e sabemos…

Glorificamo-nos, sempre que das nossas mãos escorrem pétalas em formas de palavras, fazendo jus à nossa própria existência; falhada umas vezes, engrandecida outras tantas, mas nada fazemos para adubar a terra, e dela retirar a substância que nos fará criar e engrandecer os momentos dignos da nossa própria aceitação, em liberdade e fraternidade. Caminhamos por forma a conseguir sobrepor as ideias a um único pensamento, mas ele, pobre como sempre o mundo o viu, aconchega-se ao denominador comum de alter-egos esfomeados. Abriram-se os portões à amplitude de um universo restrito de palavras vãs, no entanto, muitas diferenciadas, escancaram ao mundo, os restos mortais de alguns egos carenciados do alto, por não saberem aceder-lhes na sua forma mais pura. Copulam-se nas vertentes mais enganadoras, vivendo segundo rituais esquizofrénicos dançando e rodopiando em moldes contínuos, encurtando os movimentos sobrepostos aos nossos pés.

(Ausentes de novas formas, despem-se sobre um circulo fechado, mas caracterizam-se pelos novos modelos, que se encurtam nas distâncias de um caminho sobreposto )

Há noites, que tenho no corpo aquela doce lembrança, de quando me cingia à noite e a convidava para dançar comigo nas ruas desertas da minha cidade, mas ela, desgostosa dos dias passados, assumia-se presa à escuridão nocturna, e ali se fazia passar por mais um dia no seu términos. Vertigens enganadoras trazem-nos o mundo cortado em pedaços, e nós sempre que o abocanhamos, abastecemo-nos de gotas perdidas de orvalhos, que se prendem às novas correntes e que se preparam já para lançar mão dos nossos corpos disseminados.

In A Voz do SiLêncio (foto Dolores Marques)

quarta-feira, 17 de março de 2010

Provérbios

“Quem está no convento é que sabe o que lá vai dentro” (Imagem Google)
Enclausurei-me, sem saber como surgiu esta clausura no meu silêncio. É um mero encontro com a adversidade de meus passos até ao limite onde me encontro; anulada, esmiuçada, profanada, e sem saber como, escancarada sobre os muros que delimitam este invólucro, amealhando histórias contadas, do tempo em que me esbarrei contra os muros deste templo.
Talvez por força de pensar ser uma passagem pelo tempo, consciencializando-me, de que, se o desassossego é uma constante mudança num corpo quedo, também poderá ser um grito silencioso que se perde nas lamúrias que o tempo proporcionou. Há sempre um modo de me insurgir contra o mundo que me colheu neste emparedamento, e será de sempre e para sempre, a minha alma que se vestirá de eras outras, em que o caminho da verdade reside ainda no meu silêncio.

Sentimo-nos únicos, mortificando os momentos que nos ensinam a viver ao lado de formas e pensamentos, mas há encantamentos que nos dizem de nós, quando nos damos conta, que quem conhece as paredes frias de um convento, saberá a medida exacta de um traço, que trace o destino, e o conduza adentro de um único caminho.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Poeta do Mundo e Para o Mundo

(Foto, Dolores Marques)


A verdade que se encontra no limite, marcando os tempos mortos de um poeta, é sempre aquela que o conduz ao ponto circunscrito, dos que já viveram na imensidão de um mundo, que, cativo às lembranças de um passado, o caracterizam; Poeta das mudanças, as quais, jazem aos pés do poeta que se julga impune, por ter nas mãos a pena de ouro que o levará às alturas, através da catalogação de ideias formando a mutação do tempo que nos circunda..
Não sabermos de nós, quando nos procuramos nas partículas de um ser comum, existente no movimento que segue os corpos, é considerarmos intransponíveis todas as sequências de imagens, de reorganização mental e ser-se imutável nas mudanças de outros mundos.

(Não saberes de mim, no momento certo em que dou conta de ti, é esborratares a vida que te trouxe ao mundo dos vivos e deitares por terra todas as diferenças que nos juntaram, e logo nos afastaram, por não sabermos dos movimentos circunscritos na medula óssea de um qualquer ditame da razão )

Sabes qual é agora a tua verdade?
Será antes de mais, a realidade que te traz do mundo dos mortos, sempre que te ouvires à passagem dos ventos e te identificares com tudo o que conheças e que revele força. Há nela uma gratidão pelo mundo que criou - um mundo que morreu no escuro e se prontificou a ser à luz do dia, o reflexo dum vértice extraído da terra viva e suspenso em matéria inerte, transportado para longe, num espaço alegórico de fundos criativos e folheados em momentos divinos. Será sempre um Poeta da terra e dos céus, aquele que conseguir distinguir as noites dos dias, assim como as verdades que o emanciparam num mundo, que o julgou em tempos, única vertente unificadora e conciliadora. De lá, poderia falar do mundo e para o mundo, se o seu propósito fosse o da unicidade e deixasse de lado os pertences que foram de outros, e por outros que já morreram.

(Ser Homem no meio de tantos os que nem vêm a luz do sol, é ser deus na união de todos os pontos da terra, e pertença de toda a humanidade, devoradora de um mundo que cai já aos pedaços).

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Verticalidades (Para JLL)


Há esperas, que nada mais são, do que fugas permanentes entre o querer e o ser, na veracidade das palavras. Serão elas um meio para atingir certos fins, sempre que vierem carregadas de imagens que transcendam a nossa postura erecta. Contudo, há na verticalidade dos nossos gestos, uma figura abstracta, e será sempre ela que nos dará um certo estilo para a composição métrica de um bom tema, em perfeita comunhão com o sentimento que se sobrepõe à razão da nossa própria existência. Que o preenchimento dos espaços em branco não deixe margens para dúvidas, pelo que nas margens também se escreve, e muitas vezes por temor aos cursos dos rios, que silenciosamente, passam sem retorno, virando costas e fomentando a postura horizontal, mais apetecível às correntes baças e taciturnas.

Há nas palavras escritas, um toque especial que nos toca fundo, e há vozes premeditadas em que o som, é uma nota solta à espera do tempo certo. Será mesmo esse o que me desperta para um encontro, onde o tempo colide com a espera e nada mais fará prever, que há um tempo certo para cada encontro. Numa dimensão mais cuidada, onde somos à transparência, um só corpo, que se movimenta num espaço aberto, há também um ponto minúsculo que separa, as pontas de um espaço fechado. Aí, teremos as mesmas distâncias coordenadas por uma única aberta no tempo. Trancam-se as vozes perdidas, movimentam-se as sombras que abraçaram em tempos palavras ocas – vácuo onde existia a formação do ser na forma original. Paradigma da inteligência criativa e sonora numa escala deveras inquietante, que me faz partir para lugares incertos. Será sempre essa espera, o preenchimento de pontos vazios num espaço cuidado e assertivo para que as mensagens não falhem, permitindo que não se espalhem como grãos de areia num deserto feito de esperas.
Os nossos tempos são unos nas distâncias que nos separam. Os seus propósitos caminharão ao lado de algum sentimento, virão a seu tempo e nos dirão de nós num tempo sem tempo, mas com todos eles alinhados e depositados num único olhar. Caminho contigo em busca de outras eras, que nos transformem, que nos digam de nós num movimento constante, por onde se soltem partículas de um sonho prestes a acontecer. Será ele, a fuga que pretendemos, quando nos comunicarmos em silêncio e nele nos encontrarmos uns e outros, mas todos UM.

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Texto dedicado a um poeta e amigo, José Luis Lopes acerca do seu poema "O Grito"

(foto minha - fim de tarde junto ao mar)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Que Culpa Tenho Eu?

(Imagem Google)
*
Quero ir por todos os cantos da terra em busca de paz. Daquela paz que eu mereço, como naquele tempo em que me via a percorrer todos os caminhos e nada fazia prever esta mágoa que carrego no peito. Se no meu imaginário, houvesse vidas ainda por chegar, seriam almas num movimento constante, abraçando o concreto e o absoluto e negando o abstracto e o irreal. Há movimentos em círculos fechados que se caracterizam pelas inconstantes movimentações das horas retidas na noite e se retraem num corpo só. Diz-me o que te apoquenta, conta-me tudo o que passou num outro tempo, em que nos retivemos nas margens do rio. Secaram todas na volta dos ventos, quando tu te viraste contra o sol. Não há culpados, não há usurpados, não há castigados nem vultos sombreados, mas tão somente, mentes que se gastam num mundo cortado em dois.
(Que culpa tenho eu se te apunhalaste a ti mesmo, e te mantiveste trancado tanto tempo, sem veres a luz do sol?)
Sabes que estes impulsos norteados e desgastados pela erosão do tempo, deixam marcas pelo chão, mas nunca o poderás saber, se as tuas marcas já vierem de muito longe, num tempo em que se gastaram os gestos e se demarcaram os sorrisos num único rosto prostrado no chão. Continuas a escrever as mesmas letras com figuras bélicas a riscar os papéis da memória, mas não sabes somar os tempos em que fomos um, e nos dizíamos de todos, na abertura dos momentos áureos, fechados há tanto tempo nas catacumbas dos sonhos. Lembrei-me de todos os anos que passaram em que escrevia para ninguém, e me limitava a reescrever, certos olhares que trajavam o teu corpo nu. Fechava os textos que te descreviam com pontos finais e avançava sempre na direcção de um ponto que me iluminasse o rosto, para te poder enxergar na luminosidade de um sorriso aberto. Sorria sempre que te via chegar. Mas indiferentes, são outros sorrisos que são portas semi-abertas em templos gastos e abafados pelos olhares perdidos e presos às lâminas que cortam o ar que respiro. Será ele sempre respirável e abomináveis os capítulos que se mostrem indiferentes à nossa história.
(E há histórias que merecem ser contadas e arrastadas pelos quatro cantos do mundo)
(“A Voz do Silêncio”)

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Nuances de Um Silêncio a Dois


Nuances...De um Silêncio a Dois (O LIVRO)

Um livro que tem como ponto de partida, a poesia a duas mãos, Ana Coelho e José Antunes
O evento irá realizar-se no dia 20 de Fevereiro próximo, e conta com o apoio da Câmara Municipal do Alenquer.
Esta apresentação está inserida na Feira do Livro a decorrer no Fórum Romeira em Alenquer, local onde será realizado o evento.
A organização do evento estará a cargo da editora "EDITA-ME" que contará com alguns momentos musicais e com as crianças presentes, irão ser desenvolvidas actividades pedagógicas por animadoras socioculturais, que estarão sob orientação de Cátia Costa.

Gostaríamos de poder contar com a Vossa presença.

Partilhamos convosco partes do prefácio escrito pelo Prof. Arlindo Mota

PREFÁCIOAna coelho e José Antunes: entre nuances, sonhos e cumplicidades

Ana Coelho e José Antunes, são dois autores com uma envolvente e genuína pulsão pela poesia. Na escrita e nos gestos, que de gestos também se constrói a poesia. Buscam com paixão e rigor o segredo das palavras, que renovam sem cessar. Parcimoniosos na utilização de metáforas, optam claramente por não assentar na metrificação clássica, salvo uma ou outra incursão, num ou noutro poema.Conhecedores da herança lírica portuguesa, não se confinam ao formalismo e abordam a linguagem com criatividade, onde os temas do amor estão abundantemente presentes, mas também o psicológico e o social (sem cair no realismo) não são esquecidos e isso revela-se ao longo de todo do livro. A sua poesia, seguindo a moderna estética, constitui a verdade de um mundo sentido por uma subjectividade; o que ela diz é um mundo para o homem, um mundo visto de dentro, mundo singular e inimitável a que só o sentimento dará acesso. Falei até agora dos autores como se fossem apenas um: eles de alguma forma a isso nos conduzem, porque se apresentam juntos, face a se face, porque o livro constitui para eles a sagração dessa comunhão. Mas, em boa verdade, se muitos traços os identificam, outros os distinguem. Ana Coelho navega mais suavemente nas palavras, é, de algum modo, o lado assumidamente feminino do livro; José Antunes, de escrita comedida, apresenta mais arestas na leitura e na interpretação da sua simbologia. Comum aos dois, a contenção vocabular e arredia da adjectivação excessiva, que torna a sua poesia rigorosa e límpida, dotada de uma invejável coerência interna.

O livro, por sua opção, apresenta-se dividido em cinco capítulos: “Momentos”; “Trincheiras de Sonho”; “Distâncias”; “Lampejos”; “Cumplicidades”.

Janeiro de 2010
Arlindo Mota

(Convite enviado pelos autores e amigos Ana e José. Conto convosco)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Há Sempre Um Novo Amanhã

Se pudéssemos continuar caminhando para a unicidade tripartida de um Deus na bem-aventurança de um mundo que nos quis, não nos afastaríamos daquele que nos recusou, por não sabermos dignificar um outro que nos uniu um dia. Incendiou-nos de dor. Aquela dor que arrasa tudo, e nos acomoda num único lugar - o da nascença, pertença nossa num ventre resguardado só para nós. É esta a dor que s’entranha nos nossos corpos, uma mudança de estádios de um amor que sempre nos uniu por não saber como existiu unicamente para nós.

Caminhávamos lado-a-lado e a praia que nos acolhia, sempre ali estava, disposta a tudo nos nossos corpos doridos nos nossos rostos sofridos. Contou-nos da gigante revolta no mar, das tristes dunas, das marés negras, dos temporais antigos e nós ouvíamos atentos o desenrolar do tempo que nos acolheu sempre e nos guardou segredos que nunca ninguém ouviu, que nunca ninguém sentiu. Seríamos um só movimento, nos círculos fechados de um mundo que se quebra sempre em pedaços nas nossas mãos, se estivéssemos juntos como quando passámos a barreira do tempo, lá nas encostas de um morro abismal, onde nos deitamos à espera que o sol nascesse, na certeza de que seríamos mais do que dois corpos à espera que o mundo baixasse a nossos pés.

Mas não! Nada nos impulsionou nesta comunidade viva, nesta inconsequente variação do tempo. Só restou um único momento intemporal, aquele que nos juntou e o mesmo que nos afastou para longe da pia baptismal. Aconcheguei-me a ele, numa incerteza dorida de nada mais conseguir saber, de nada mais me levar por caminhos outros, onde caímos todos ao mesmo tempo. Há quedas assim, que mais não são do que meras ilusões perdidas em rostos caídos, e seremos sempre um caminho a seguir para nos defrontarmos com todos os carismáticos eclesiásticos, os alicerces que nos edificaram um dia . Desde que me identifiquei com as incertezas de eras comuns à minha nascença, me edifiquei perante um mundo escancarado para outros mundos nossos que nos seguiram os passos. Há sempre um novo amanhã, e desde que a terra se movimenta em círculos, que a atmosfera se desprende do vácuo, desta irmandade circundada por viagens no espaço. Há um passado morto nas encostas de um novo futuro, e ele está agora preso a nós, se nos focarmos num único ponto. Seremos sempre unificação presente, e os vértices que se assemelham a pontos no espaço, serão unos em todo o amanhã....
(Foto Dolores Marques)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Esperarei Por Ti


Neste agora eu me detenho perante a instabilidade de um abraço
E assim irei por todos os cantos que conheço e esperarei por ti...
Ou por um outro que me queira
Que me siga na inconsequente mudança em que me adenso

Não um qualquer que se diz de si
Mas alguém que queira saber-me prestes a culminar de um desejo vivo
E de uma vida alheia em mim

Há um líquido brilho que me tolda os pensamentos
E os encaminha até às vastas marés
São elas que confundem tudo nas funduras de um mar feroz
E nós ficámos a vê-las engolir todas as águas
E todos os jardins erigidos no altar-mor do nosso corpo

Fiquei assim perdida na lonjura do tempo
Que se cruza com os tempos que por mim se perderam
E me diz de tudo um pouco
Se eu souber escutar
Se eu souber calar
Se eu souber ser duas numa noite só
Para me ter e te querer
Para me resguardar de todas almas que me queiram viva
À roda de um mundo que sofre e se ajoelha por nada

Fico assim…
Girando em cima de uma mó presa ao vento que passa
E as águas gastaram-se nas colinas
Enquanto me preparava para dormir um sono leve e ir…


terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Uma Era Em Construção (Para Giraldoff)


Uma variação no tempo, no nosso tempo, em que construímos um novo modelo de um tempo novo só para nós; e para quem quiser vir vê-lo, e senti-lo, e abraçá-lo através de nós.

Paralelamente, somos todos num, e um em todos os fragmentos, em todas as ressonâncias magnéticas de um Universo abstracto que vive para lá de nós, num imaginário concreto e absoluto.

Há uma inconstante elevação do pensamento. Será ele uma dose caricaturada por excelência, se nada pensares e a nada te obrigares. Ser, é unicamente Seres uno em ti, e por ti se seguires a rota constante de somatórios que alcancem a rota dos ventos.

Vês-me daí ?

Serei sempre uma só semente a inundar a terra, e verás que ela será sempre um chão ressequido, mas te dará sempre uma mão, para que possas sentir a força dos dias e das noites em comunhão com outras dimensões.

Somos assim:Uma era em construção. Tu e Eu
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Dedicado ao meu amigo Filipe Campos Melo (Giraldoff)aqui:

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Seremos Iguais a Ti


Preciso de ti aqui
Há um buraco no chão
Há uma aberta no mar
Há um caminho no céu
Que me faz ser em vão

Lembro-te daquele tempo
Em que já nada restava
A não ser uma dormente apatia
Pelos rostos esquecidos
Pelos corpos doentes
Pelos sorrisos das crianças
Enfermas
Cativas
Abandonadas
Esfomeadas

Ou já te esqueceste de mim
A cair nos braços de um mundo
Que já não sabe se ser igual
É ser-se imóvel no tempo
Ou ter nas diferentes imagens
Um mundo peregrino
Num Universo restrito de palavras

Há no avanço das horas
E nas manhãs frias de Inverno
Gritos que se perdem
Por becos sombrios
E efémeros gestos
Que se gastam nas valetas
De um recanto que já nada sabe da vida

Seremos iguais a ti
Sempre que os olhares se cruzem
E se movimentem para lá deles

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

As Minhas Palavras


Serena, imóvel mas inquieta
Por verdades que esqueço
Por vaidades que abraço
Por inconsequentes
Marés de cansaço

Sou tudo o que quiseres
Neste mundo que chora
Por um único abraço
Sou remoinho de vento
Sou fatia de pranto
Enquanto me não refaço

Invisível é o meu traço
Há um esboço do que sou
Nas escadarias de onde venho
Que se quebrou em pedaços
Quando voltei a minha face nua
Para as ruas onde me enlaço

Acasos de uma morte anunciada
Prestes a cair no nada
E insinuada pelas máquinas do tempo
Que me arrastam do sítio onde nasci
E me contam de um mundo
Gasto em palavras

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Ultimatum

Debrucei-me sobre as aspas de uma frase oblíqua
Saliente, tosca, disforme mas de cintura fina com um brilho mate
Distante, tão distante estava eu antes dela me reescrever
Fui caminhando sem ver
Fui cessando sem saber

Havia um só tempo para seguir aquela linha inteira
Que me traçava um caminho aposto no meu imaginário

Já não sou eu que quero ser uma frase inteira de um céu sem cor
São elas, as aspas que me fazem ser alguém
Ou nas horas mortas ninguém

Já não sou eu que quero ser uma palavra vã,
Achada por morte sã
Catalogada e alegórica(mente) certa , mas indiscriminada
E sujeita ás mais diversas alterações morfológicas
Resíduos que se despejam nas marés vivas de um desejo traído, cuspido, sujo

Caiu agora desse mastro antigo
Desdita esta sorte mal(dita) em pedaços
Que se entrega à dor das palavras sobrepostas
Viajaram caladas nas costas arqueadas de um marinheiro já morto
Deram um saldo no mar alto e afogaram-se inteiras na linha disposta sobre a mudança das marés
********************
(Eu na foto, da autoria de José António Antunes)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Sigo-te


Um ritual que apetece seguir
este teu caminhar sobre as águas
sempre incentivador
à volta das marés claras.

Há na força dos ventos
uma brisa que te acalma
nas manhãs submersas
e sou tudo o que disseres
quando já nada quiseres ser em mim

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Um só verso no teu caminho e o meu corpo caravela


Se me propuser a ser um só verso no teu caminho
Tu verás que há noites, menos noites, e dias menos dias
Caminharás por sobre a crosta terrestre
E eliminarás um espaço que te sente numa vida quebrada em pedaços
(Se tu te dispuseres, a ser mais que um poema, na varanda dos teus sonhos
Eu farei das tardes, outros mundos e do meu corpo caravela)
Mas se por acaso na tua memória
Eu anoitecer num espaço fechado
As noites farão tudo por mim
Quando te anunciarem
O que há muito te contaram
Mas que esqueceste

(Restamos assim tu e eu, pelos tempos que ficarem)


segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Em segredo (XIV)

(Foto, Dolores Marques)
*
Sofro da dor que se enquadra
Nesta tela ainda fresca
Da minha memória:

Um caminho cruzado
Os Deuses sempre em festa
E nós largados ao abandono

Se quiseres
Dar-te-ei os meus lábios
Em troca de um último segredo teu
E que os corpos se aquietem
Num leito feito de aromas
Unção predestinada a ser
Um desejo só nosso
*
(Segredos Meus/09)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Personificação de Um Alter-Ego, Essa Entidade Viva



O início de mais um ano nas nossas vidas, será antes de mais um inicio de mais um caminho que se abre às mais variadas mudanças que se têm como certas. Será só uma dose individual de vivências, que transformaremos em sonantes e diversificadas notas soltas que se espalham pela nossa mente, se virmos a mente como um refúgio para os tons mesclados de alter-egos. Mas se nos focarmos no centro, aquele mesmo ponto de onde saímos e para onde vamos sempre que o nosso ego se ramifica espalhando vários tipos de personas qualificadas pelo nosso interno e consciente saber, veremos as mais variadas formas de conseguir transportar todas as maleitas de que somos vítimas, e consertar ou quiçá, remendar a nossa mente adjudicando propostas de um alter-ego menos egocêntrico num sentido mais lato.
Este é um ano que me proponho ser mais que um simples papel escrito nas memórias de uma vida. Serei antes de mais uma pessoa que se encontra sempre que ama, mesmo que esse amor vá de encontro a retalhos à vista, feitos de consumismo barato. O que se consome, nem sempre é de melhor qualidade, mas o gosto com que se pratica o consumismo, é um gosto que fica para quem sabe que o consumo é ou deve ser tido, como uma satisfação das nossas necessidades e não um granjear do supérfluo, que nos faz engordar e também inchar à custa do ar saturado de atmosferas densas e poluídas. É um gosto saber-te aí e imaginar que me estás a ler agora, e que sorris porque entras em mim e eu em ti, sem o toque da pele esquentada e sem o olhar flamejante. Daí não saber muito bem se concordo com esta tua frase: “torna-se viciante para o nosso ego essas manifestações de carinho constante”. Vou-te saboreando na medida certa, sempre que te sinto através das palavras que escreves e isso para mim basta por agora, porque sei que este “agora”, é o que de ti recebo. Acolho-o com o carinho de sempre, assimilando só o essencial. O teu EU mais profundo.
Existe na força viva que carrego um movimento que desconheço, mas através dele, farei uma movimentação diferente aos olhos e dar-me-ei a conhecer a mim própria através da forma como me sinto quando partilho algo. Nunca, qualquer manifestação de carinho, se interpôs entre um ego mais necessitado e um alter-ego mais realizado, e talvez por isso eu goste tanto destas manifestações que prefiro dizer que Amo, para que não haja atritos entre eles.
Mas isto tudo só porque te queria desejar um ano fantástico e vê no que deu, logo eu deixei e ser eu, para ser um alter-ego qualquer em busca daquilo que o ego tem – Suposições e frustrações de quem não sabe, que o AMOR só é importante na medida em que o sentimos dentro de nós. Falo-te de um sentimento que enaltece qualquer ser humano que se preste a Ser antes de mais e que sinta que o Amor é para ser “consumido”, nas doses certas, sempre que a pele respirar o tal aroma quente e aconchegante. Nunca o AMOR será palpável nem materializado em casos de última hora ou até uniões vs concentrações para um futuro imediato, será sim uma entidade viva e vigilante em cada Pessoa. Mas, para que isso seja possível sem nos despojarmos de nós, teremos que nos separar de egos indesejáveis, ou então não haverá solução e teremos que esperar pela verdadeira mudança, que estou certa irá deitar por terra, todo um conjunto de vivências de uma vida. Penso que ela já faz parte de um processo onde estamos todos inseridos, e acredito que essa mudança está a acontecer neste momento em todos nós sem nos darmos conta disso, pois manifesta-se através das mais variadas posições na vida. Podem até ser as mais inconscientes, e até as mais revolucionárias dando forma aos pensamentos, mas será muito também na postura e no confronto com o outro. Esta nova era, será o volt-face, o início da verdadeira mudança que começa em nós, no nosso interior e vai fazer com que nos transformemos internamente ao ponto de nem sabermos quem somos, quer pelas manifestações de carinho e amor, quer pelas manifestações de ódio que nos consumirá até à mais ínfima partícula do nosso ser.

(In A voz do Silêncio – Carta a uma amiga)
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Vem Sentar-te Comigo Lídia à Beira do Rio
..."Desenlacemos as maos,
porque nao vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixoes que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar...."

Ricardo Reis (F.P.)

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Movimentos(P/Rosafogo)

(Foto, Dolores Marques - Vistas para a segunda Circular)
*
precisei destas palavras tuas
nestes dias
em que a chuva me entrou de rompante
pela fronte ressequida
e eu, alheia ao movimento das águas
*
(segui-te os passos
e encontrei-me e em todos os recantos que conheço)
*
Mulher que me falas assim
que te deitas nas noites
e adormeces o fado quente
a luzir nas paredes frias
de uma vida que grita
por ti
e por mim
num vazio encontro nas ruas
*
Estou por aqui, sempre que te esqueças de ti

*
Agradeço a Rosafogo, a inspiração para este poema, aqui:
http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=107915